Posted by : Francisco Souza
quinta-feira, 1 de março de 2018
O QUE É SER SAL DA TERRA ?
"Vós sois o sal da terra;
ora, se o sal vier a ser insípido, como lhe restaurar o sabor? Para nada mais
presta senão para, lançado fora, ser pisado pelos homens." (Mateus 5:13)
Nos dias de Jesus, todos os
grupos religiosos de Israel viviam como sal dentro do saleiro. Alguns deles não
mereciam nem ser chamados de sal, porque tinham perdido completamente o sabor.
A santidade, existencialmente, começa dentro, no interior do indivíduo, mas tem
sua representação na secularidade, no mundo. Os conteúdos cristãos tem que ser
colocados de maneira que a sociedade humana os perceba, a fim de que o desejo
de Jesus se cumpra; para que, vendo o caráter da Igreja e suas ações, o nome do
Pai, que está nos céus, seja glorificado. Isto é ver a reprodução do
"jeito" de Deus no mundo, nos Seus filhos que, à semelhança do Pai,
são bondosos, generosos, sensíveis para amar e perdoar, humanos, intensamente
apaixonados pela obra, comprometidos com a missão, conscientes do seu tempo e
da sua hora e da responsabilidade para com Deus e para com o mundo, respondendo
a este com o mesmo amor com o qual Deus reage todos os dias, fazendo vir sol
sobre maus e bons e chuva sobre justos e injustos:
"(...) porque ele faz
nascer o seu sol sobre maus e bons, e vir chuvas sobre justos e injustos."
(Mateus 5:45)
Com isso Jesus estava
querendo dizer:
"Vivendo assim, afeta-se
de tal modo a sociedade humana, constrangendo-a de maneira tão profunda,
impactando a 'consciência' do planeta, que se força ainda que sem palavras, sem
alardes, sem pressões, sem manipulações e sem tirania , o mundo, a despeito da
vontade e da consciência deste. Deste modo, força-se o planeta a glorificar o
vosso Pai que está nos céus."
No entanto, nos tempos de
Jesus, não havia essa visualização de se ter um grupo humano vivendo em nome de
Deus as implicações de uma fé que produzisse no coração da sociedade humana
essa resposta de perplexidade, de êxtase diante da verificação da presença de
Deus na vida de Seus filhos. Ao contrário, havia grandes grupos religiosos
vivendo, cada um a seu modo, uma vida seca, estéril, oca e concomitantemente alienada
do planeta, cheios de motivações religiosas e vazios de Deus. E quase sempre as
motivações religiosas daqueles grupos os impeliam a uma relação de
distanciamento do resto da vida em sociedade, por razões as mais distintas.
Havia, por exemplo, o grupo dos essênios, os quais viviam às margens do Mar
Morto, afirmando, da maneira mais maniqueísta possível, a divisão entre o bem e
o mal no mundo, além de acharem que eram a semente dos filhos da luz do
planeta, e que o resto da humanidade estava fadada à condenação e ao juízo. Por
isso, o movimento dos essênios foi de retração não apenas física e geográfica,
mas de alienação espiritual, mental, quase que total, acerca do que acontecia
com o resto da história humana, especialmente com Israel.
Havia também o grupo dos
fariseus, os quais não viviam separados, mas que assumiram para si uma
"superioridade religiosa", os quais se concebiam como o grupo
religioso mais acentuadamente preocupado com as obrigações e realizações dos
caprichos divinos na Terra. Caíram num literalismo total relativo à Palavra de
Deus. Se Deus dizia:
O QUE É SER SAL DA TERRA?
"Guarda a Palavra na tua cabeça."
Eles amarravam uma caixinha
de couro na cabeça com um pedacinho da Lei dentro, e andavam com ela na testa.
Se Deus dizia:
"Põe a Minha Palavra no
teu braço direito."
Eles amarravam do mesmo modo
caixas ao braço contendo porções da Escritura, objetivando dar uma
materialidade total e absoluta, numa intenção de cumprir a Palavra de Deus,
literalmente. Se se dissesse:
"Põe-na nos umbrais da
porta da tua casa."
Eles faziam a mesma coisa.
Viviam num literalismo absoluto, no cumprimento da Palavra. O que Jesus
denunciava nos fariseus era essa exterioridade sem nenhuma conseqüência
prática, tal como a Palavra que carregavam na testa como fetiche divino, mas
que não era trazida no coração, não humanizando a vida, não a tornando mais
generosa, mais obediente; não a desafiando a uma proximidade maior de Deus, da
Sua Palavra e da necessidade do próximo. Um outro grupo era o formado pelos
Zelotes que assim se chamavam porque se achavam os portadores da espada da
justiça divina no planeta. Segundo eles próprios, eram cheios de zelo para se
fazer justiça, seja ela política ou social. Também se alienavam do resto do
mundo, não necessariamente por razões religiosas em função de cerimoniais,
liturgias ou pelas mesmas razões do legalismo dos fariseus ou da alienação
maniqueísta dos essênios, alienavam-se do resto do mundo pelo simples fato de
que eram politicamente obcecados, puristas, detalhistas, cheios de juízo, de
preconceitos, dominados pela idéia de construção de uma teocracia na terra, a
qual fosse constituída por uma sociedade que preconizasse os valores vividos
por eles, exercendo o poder, em nome de Deus. Por isso, eram alienados do resto
do planeta, vivendo sua própria causa, suas próprias discussões, alimentados
dentro do seu próprio mundinho, fechados para as grandes demandas do resto da
sociedade.
Outro grupo contemporâneo de
Jesus era o dos saduceus, cuja maioria era formada de sacerdotes, portanto,
trabalhando dentro do templo, oficiando, diante de Deus, todos os sacrifícios e
todas as cerimônias. E, justamente por esta razão, presos dentro dum claustro
litúrgico que não se comunica com as demais dimensões da vida. Surge Jesus, num
ambiente religioso como este, e fala não necessariamente para nenhum daqueles
grupos específicos, não Se dirigindo a uma platéia formada por essênios,
fariseus, zelotes e saduceus, mas a uma platéia formada por gente que não tem
"pedigree", que não carrega "grifes" religiosas, ou seja, a
um grupo formado por pessoas do povo: pescadores, fiscais de impostos,
prostitutas sensibilizadas, pais de família curiosos, mães esperançosas, gente
simples que vem de todas as partes; gente doente, angustiada, possessa,
oprimida; gente sadia, gente alucinada, gente culpada, outras nem tanto; enfim,
gente de todo tipo. Jesus olha para aquelas pessoas, vendo a semente de um novo
tempo e de uma nova comunidade; vendo nelas o que ninguém mais vê; enxergando
nelas um potencial que só Deus consegue vislumbrar na pessoa humana. Jesus olha
para aquelas pessoas, cuja maioria não tinha nome, estirpe, precedidos apenas
pelos primeiros discípulos que já naquela hora estavam se transformando em
apóstolos; os outros eram uma massa anônima. E Jesus lhes diz, com toda esperança
de Deus falando ao homem; com toda a vontade Divina de ver a Sua Palavra Se
materializar:
O QUE É SER SAL DA TERRA?
"Vós sois o sal da terra;
ora, se o sal vier a ser insípido, como lhe restaurar o sabor? Para nada mais
presta senão para, lançado fora, ser pisado pelos homens." (Mateus 5:13)
Quando se observam os outros
evangelhos e os movimentos de Jesus, parece que, até aquele momento, não havia
ninguém consciente da possibilidade de se viver uma vida tão fantasticamente
desafiadora e revolucionária. Ninguém jamais disse isso. Olhar para um grupo de
excluídos, de indigentes e dizer-lhes:
Em outras palavras, Jesus
estava lhes dizendo:
"Vou transformar vocês
naquilo que vai dar gosto ao mundo. Vou jogar uma 'pitada' de Deus neste
planeta. E conto com vocês para serem esse tempero da graça divina na
Terra."